Fernando A Freire

Amar a dois sobre todas as coisas

Textos

A COPA É AQUI, ORA BOLAS!...
 

Os jornais noticiam que hoje, no Sudão do Sul, mulheres e crianças foram tiradas, à força, de dentro das escolas e dos hospitais, depois espancadas e mortas nos acostamentos das estradas.  Criaturas inocentes.  “Perverso preconceito”.

Em nosso País não é diferente.  No mesmo instante, em São Paulo, espancaram até a morte uma inocente mãe de família.  “Perverso engano”.

 
Uma criança é atirada pela janela.  O pai parecia querer livrar-se do “absurdo” de uma pensão alimentícia!...  Outras crianças são assassinadas também pelos próprios pais, ou por suas fúteis e carrascas amantes, enciumadas...


Jornais, todos os dias, nos chegam umedecidos de sangue.  Internet trazendo rápidas mensagens – ora mentira, ora verdade – em glóbulos avermelhados. 

A tecnologia removendo montanhas.  O ser humano perdendo a fé e se voltando para as cavernas.  Jovens estudantes/internautas escrevendo “felicidade” com “SS” ou com “Ç”.  Simplesmente desconhecem-na.  Esqueceram o seu sabor, seu belo significado entre os viventes e raros conviventes de boa índole que ainda ocupam este planeta.


Hoje, no Rio de Janeiro, o crime organizado forjou uma greve de ônibus urbanos, em que o sindicato da categoria desconhece o seu comando e suas razões.  Razões políticas, evidentemente, no ensejo da Copa Mundial da FIFA.  A baderna traz a intenção do prejuízo. Até agora, quatrocentos e sessenta e sete ônibus incendiados ou  depredados, num mesmo instante.  Que pague o povo.  Cega disputa pelo poder por caminhos ilícitos, cujos interessados se utilizam da estratégia de mostrar o quanto são pessoas infelizes e a quantos quilômetros por hora viajam a sua ira e o seu instinto de crueldade. Parece que suas visões e suas emoções, enrijecidas, nada têm a ver com as coisas belas da vida.   Enquanto uns se esforçam para mostrar o que temos de belo, outros se deleitam demonstrando o seu lado horrível.

Reflitamos.

Futebol é um esporte, podemos dizer, carismático.  Sempre arriscamos a dar um chutezinho na bola que vem aos nossos pés.  Quem não o faz?!...  Acho que é porque a bola é redonda, porque a Terra é redonda, porque a própria linha reta segue um trajeto redondo, porque até um diminuto ponto é redondo... 

. . .
Nessa disputa entre os times do bem e do mal, precisamos vestir uma camisa, isto é, cabe-nos fazer parte de uma torcida, assumir uma posição:

- chutar ou esfaquear a bola?
 
- arremessá-la para o outro cabecear ou, no instante do arremesso, trocá-la por uma pedra arrancada do calçamento onde o turista, por certo, vai tropeçar? 


- gozar da felicidade, da gostosa sensação de um grito de “gol”, ou por outra - no ensejo da euforia -, atirar um rojão a esmo, causando a morte ou infelicidade de um tranquilo e inocente torcedor, que, ao invés de um grito de "gol", vai clamar desesperado por socorro num grito de dor e de agonia?
. . .
Comparemo-nos, pois, nos dois momentos dos últimos sessenta e quatro anos de nossa história.

Era a metade do século passado.  Realizamos uma Copa em nosso País.  Perdemo-la.  Nada foi quebrado, nem mesmo o enorme silêncio que cobriu de tristeza toda a nação, quando o Uruguai se mostrou mais capaz.  Uma Copa que jamais será esquecida, principalmente pela grandeza de um povo que soube perder. Para realizá-la, construímos o estádio do Maracanã, à época o maior e mais bonito do mundo.  Tínhamos muitas carências sócio-econômicas.  Continuaríamos a tê-las caso não tivéssemos construído o belo estádio – diga-se de passagem –, até hoje palco de grandes eventos esportivos e culturais.  Por que os jogos da Copa, naquele inesquecível ano cinquenta, ficaram restritos ao eixo Rio - São Paulo?  Por certo, dificuldades de interligação, vias aérea ou terrestre, e infraestrutura deficiente nas demais regiões.  Todos entenderam as razões.

Desta vez, século XXI, doze estados estão sendo contemplados.  Bem ou mal, estão integrados e interligados.  "E por que o luxo?  Não poderiam ter somente melhorado seus antigos pequenos estádios?"  Já ouvimos essas perguntas alguns milhares de vezes, não?!...  Ora, se não se desse uma condição de igualdade na qualidade e na beleza de todos os estádios (ou arenas) que foram construídos ou reformados, a crítica recairia sobre a parcialidade. Estariam a perguntar: "Por que uns com mais e outros com menos?"  Uma questão de visão e de senso crítico.  Mas, quanta coisa boa virá para a juventude esportista no depois da Copa!  Duvido que um só desses estádios vire (o que já ouvi até demais dos pessimistas) um elefante branco. Ora, o Sambódromo, no RJ, virou escola, uai!... Uma coisa é certa:  seríamos muito incompetentes se os estados agraciados não tirassem o maior proveito possível dessas obras, dessa dádiva!

Relembro e escrevo esses fatos para você escolher em que lugar da arquibancada nacional você deseja ficar, especialmente nesse consagrado momento histórico que vai ficar registrado para a posteridade:

- de frente ou de costas para o campo onde o grande espetáculo da Terra se desenvolve;

- dentro do estádio, do seu clube, do seu lar, regozijando-se, abraçando o seu irmão no momento do gol, ou nas ruas, fora do estádio, depredando tudo o que vê pela frente:  quebrando vidraças; atirando vasos sanitários em pessoas desavisadas; queimando o transporte coletivo que talvez você mesmo precisasse usar (o sanitário também);

- alimentando o seu espírito com o que é belo, ou desenhando com fogo uma inimaginável cena terrorista, tirando-nos o sublime direito de sonhar?

Ainda somos o país do carnaval e do futebol - isso é incontestável.  Fizemos, neste ano, talvez o melhor Carnaval de todos os tempos.  Quanto se gastou?  Alguém reclamou?  Por acaso, baderneiros rasgaram adereços, fantasias ou tamborins?

Para repetir a façanha, pra fazer soprar o mesmo vento alegre no futebol, que está no nosso sangue, pediríamos aos maus políticos – que, sub-repticiamente, promovem (e financiam) a baderna –, tirassem suas máscaras, pelo menos durante a grande festa da solidariedade humana.  Depois a gente volta a ser o Sudão que eles desejam . . .

Pra frente, gente!  A emoção é nossa!
 
Fernando A Freire
Enviado por Fernando A Freire em 09/05/2014
Alterado em 12/05/2014


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