O CONGELAMENTO DA CRISE
Meu caro Sérgio, Respondo o seu e-mail de ontem, em que você, embalado pelo otimismo da campanha presidencial aí dos EUA, referindo-se à atual situação política do Brasil, concluiu-o com a expressão: “Tempos melhores virão”. Torço para que esse seu sonho aconteça. Ficaria mais tranquilo se o caminho desses "tempos melhores" tivesse como trilho a EDUCAÇÃO. Lamento dizer que na próxima semana o Senado estará confirmando a decisão da Câmara dos Deputados - PEC 241 (projeto de emenda constitucional) - de congelar por vinte anos as verbas destinadas principalmente à educação. Até agora, eu entendia o setor educacional como ATIVIDADE FIM. Se assim ainda fosse, caberia investir prioritariamente nesse setor, todavia, como atividade meio (forma como deverá ficar) a educação virará ruínas. Digo, orgulhosamente, que nos últimos treze anos vimos a implantação de universidades nas cidades do interior do país – aqui na Paraíba, em Patos e Cajazeiras -, além de faculdades em muitas outras cidades, do estado e do país, sem falar nas inúmeras escolas profissionalizantes. Ufa!... Pelo menos, com essa avalancha de escolas aprendemos que ALEGRIA DE POBRE SÓ DURA TREZE ANOS. É que, pela lógica do poder constituído, essas escolas começarão a fechar já a partir do próximo ano, claro, em decorrência da limitação de recursos para a educação. Uma limitação agora institucionalizada e com data aprazada. Vinte anos valem uma geração de jovens. Tempo suficiente para que não sobrem pedras sobre pedras do tudo que foi feito. Foi assim no golpe militar de 1964: uma reforma no sistema educacional – semestralidade das disciplinas –, com o fito de evitar o surgimento de lideranças estudantis. Todos aplaudimos, mas depois vieram o apresamento, eliminação ou deportação de destacados mestres do ensino, público ou privado. Quê reforma? Tudo se repete no atual golpe branco. Aliás, nem precisa ir longe. O mesmo golpe branco ocorreu recentemente no Paraguai, em Honduras, em Porto Rico... Um golpe frio, sem armas de fogo. Aconteceu no momento em que o executivo encontrava-se, e encontra-se, sem respaldo popular. Num momento em que o apoio popular aos parlamentares também é zero. População sujeita às decisões arbitrárias de um governo desprestigiado e que dá as costas para os graves problemas sociais com os quais convive. Que sobrevivam os milionários!... Na verdade, eu gostaria demais de não gaguejar quando tivesse de pronunciar essa frase por demais otimista: "Tempos melhores virão". Virão?!... No final da década de cinquenta e início da de sessenta, MacCartney afirmou: "Não queremos um novo Japão na América Latina". O Japão havia crescido com base no seu desenvolvimento educacional. Sempre que o Brasil esboça essa probabilidade de crescimento, um novo tipo de golpe o atira para trás. Dá-se o mesmo nos demais países vizinhos. Lastimo demais esse domínio secreto, seja como brasileiro, seja como autêntico latino-americano. Aí, para calarmos a boca, a imprensa (também milionária) brasileira assusta-nos a todo minuto com este palavrão: "CRISE". Uma crise que vai perdurar por vinte anos, cutucando nossos ouvidos com o cotonete de um mandante que quer se popularizar apontando as "falhas" do governo que ele derrubou. Só não consigo entender essa tal crise num país que dispõe, hoje, de 375 bilhões de reservas internacionais (em 2002 eram apenas 30 milhões) e a bolsa de valores, no pós-impeachment, já tendo dado nesse curto prazo um lucro superior a 40%... Aqui, meu caro, enquanto a bolsa de valores cresce, o bolsa família desce – e vai murchando propositalmente a cada dia que passa. Se não entendesse nada disto do que acabo de escrever, com absoluta certeza eu estaria otimista. Mas, como ser otimista, trancado numa senzala ou amarrado no pelourinho?!... O fato é que continuamos encabrestados no quintal de um casarão maior e nada podemos fazer para reverter nossa subserviência. Grande abraço. Fernando A Freire
Enviado por Fernando A Freire em 08/11/2016
Alterado em 16/11/2016 |