Fernando A Freire

Amar a dois sobre todas as coisas

Textos

 
SEM SINDICATOS ORGANIZADOS, NUNCA DANÇAREMOS TANGO !
 
No Brasil, precisamente em São Paulo, a “25 de março”, ruas intransitáveis.  Lojas - chiques ou populares - inacessíveis.  Todos compram.  Se o dinheiro é pouco, muitos se endividam.  Outro mês de janeiro há de chegar, bem no começo de um novo ano (2018), recheado de contas a pagar: matrículas, material e fardamento escolar, taxas e impostos federais, estaduais e municipais muito acima da inflação...  Faltarão forcas ou cordas para os milhões de pescoços inadimplentes.  Uma novela que se reprisa a cada ano.  Celebra-se um aniversário sem a presença do aniversariante...

No futebol, Jô é “o cara”, mesmo tendo gol de mão no seu currículo, mas vale a opinião de uma maioria esmagadora de torcedores:  aqui, futebol, praia e carnaval são nossas células sanguíneas.  Hemácias com odor de cachaça.  Só o futebol reúne multidões. Se tudo isso existe e permanece, pode o governo acabar com todos os nossos direitos adquiridos nas lutas de muitos carnavais, anos e anos atrás, sem qualquer constrangimento. É só pôr sua bola em campo. Não reagimos. Somos movidos a abadás.  Ele implanta em nossas cabeças: um chip do divertimento e outro do esquecimento. Em suas mãos, as rédeas do seu time: um divertido parlamento. Quem se lembra da deputada Ângela Guadagnin, que perdeu o mandato porque dançou de alegria num momento de vitória de um seu semelhante? Mais tarde, quem viu e ouviu o deputado Marun cantar e dançar, também no parlamento, "tudo está no seu lugar" (de Benito de Paula), comemorando a vitória de um sujeito tão crápula quanto ele, e nada aconteceu, segundo ele, "graças a Deus" ? ! . . .  Perdão, aconteceu, sim! Marun terminou agraciado com o cargo de Secretário Geral do "governo" que ele tão corrompidamente defendeu.  Vimos e não reagimos.  Somos uma república de meninos governada por um punhado de cretinos. O chip que nos põem no momento é o do esquecimento. Que venham nossos “hermanos” usufruir de nossas praias, dançar nosso samba, bebericar nossa caipirinha...  Nem adianta ensinar-nos o tango, porque a gente - logo, logo - vai deslembrar.

Na Argentina, enquanto aqui estamos a encher a cabeça de "entulhos políticos" e os carrinhos de compras,  o povo vai às ruas protestar contra a única reforma prejudicial aos trabalhadores: a reforma da previdência.  Conseguiu adiar, o que significa uma demonstração de força.  Três dias depois, com o povo ainda na rua, o Congresso consegue driblar e, sob forte aparato policial, aprova a tal reforma antipopular.  Mas é um povo guerreiro.  Apesar de o fato estar consumado, o povo continua a protestar nas ruas.  É um recado que dá à futura geração: “Nossa luta é tão valorosa quanto a vitória” - cantam os que encantam o mundo.

Aqui, tudo  é diferente: só vamos às ruas – as vezes até fanatizados pelas redes sociais –, quando um poder maior nos convoca.  E que poder, hein!... A FIESP, sub-repticiamente.

Por que nossas diferenças em relação aos "hermanos"?

Primeiro - o óbvio -, porque somos subservientes por natureza. Temos sangue escravo, e haja sangue!...  Ainda vivemos sob um regime escravocrata disfarçado.

Depois, por conta de nossa desorganização sindical.  Uma desorganização propositalmente provocada por vinte e um anos de amordaça ditatorial.  Nada mudou. Temos sindicatos, sim, reativados no regime pós ditatorial, mas aprendemos a deles fugir por falta de atrativos.  Deixamos tudo nas mãos de “pelegos”, os quais nem elegemos.  Duvido que ocupemos as ruas convocados por apelo dos sindicatos!...  Senão os sindicatos, que outra organização têm os nossos trabalhadores para lutar contra os seus direitos usurpados? 

Agora, somos meros observadores de nossa própria agonia.  Três  poderes – político, legislativo e judiciário – contra o poder maior, que é o povo.  

Vejam a diferença.  Nossos “hermanos” são politizados porque são todos sindicalizados.  Nenhum trabalhador na Argentina consegue emprego sem o intermédio do representante de sua classe.  Ora, se todos tomam parte, a força sindical fica gigantesca e socialmente valorosa, não importa quantos sindicatos sejam.  Vejam as árvores de uma floresta ! . . .  O resultado é um sindicalismo sem peleguismo, atuante, em que  seus associados participam diretos dos debates econômicos, educacionais, culturais e sociais do país.  Nossos “hermanos”, tão bons em futebol quanto nós, são craques insuperáveis em prêmios Nobel (o que a cada ano mais nos distancia);  são grandes anfitriões (o que nos aproxima) e, políticos de boa cepa, são capazes de nos derrotar de sete a um nessa área.  Precisamos nos unir, antes que nos imobilizem com os grilhões da perfídia.   Dispomos de quase dezessete mil sindicatos, um terço deles pertencente aos empregadores.  Precisamos organizá-los para, na verdade, defenderem os nossos legítimos direitos.  Pensem.  Somos milhões de árvores isoladas.  Quando nos uniremos para formar uma floresta?
Fernando A Freire
Enviado por Fernando A Freire em 21/12/2017
Alterado em 22/12/2017


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