a esperança está em crise
A indignação atiça a esperança em sociedade capitalista sem capital. A "sorte" é o único valor em poupança guardado no frio cofre da geladeira. Pode um dia ser compartilhada entre amigos, filhos e a companheira. . . . Tenta consumi-la seguidas vezes: frustrante lambe-lambe de gelo. A cada semana, um novo apelo, igual ao aluguel de todos os meses. Sonha com o fim do pesadelo. enroscado numa rosca sem fim. Tiro por mim. . . . E a "sorte" como sorvete lambida foi totalmente consumida, mas não alimentou. Ninguém acertou, Acumulou, entretanto, quanto mais gente empobrecida, mais gente pobre entra e tenta. . . . A "esperança", irmã gêmea da "sorte", igualmente consumida, mais forte que a morte, não se cansa de dizer: "Serei a última a morrer" . . . Mora nas casas lotéricas, a loto fácil da esquina que a todos acena com a "sorte" pequena ou com ideais quiméricos, Lá, "sorte" e "esperança" combinam a refeição dos otimistas do concentrador sistema capitalista. . . . Aí, ambas sopram aos ouvidos dos poucos (que ainda têm um pouco) e dos muitos que, se nada têm. nada poupam: "Compre uma cartela, ou um bilhete da fortuna, só pra tentar a `sorte´, e conte comigo, não se importe!" . . . E o pobre ou arremediado faz o cinto apertado: vende a geladeira, diminui o leite do filho e o pão da companheira. Joga. É sexta-feira. Não faz a feira. Leva para casa, numa sacola, por segurança, a sedutora "esperança" . . . Sábado e domingo, divide com ela o seu travesseiro. Segunda-feira, acorda feliz. Toma um banho com "esperança" inda flerta com ela no espelho. Vai ao trabalho animado, e "esperança" ao seu lado. . . . Desvia o caminho para conferir a sua cartela na casa lotérica. Aí, recebe a triste notícia da súbita morte da "sorte"... Pega nova cartela, por que não?!... Acredita na ressurreição ! . . . Despede-se da irmã da falecida convidando-a para novo encontro: "Final de semana, querida" única chance de esquecer a crise, seus aproveitadores, suas raízes. Não há dúvida: são os seus dois dias mais felizes! . . . Ufa!... Chega atrasado ao trabalho. Acontece o mesmo toda segunda-feira. Outro empregado já ocupa o seu lugar. Procura novo emprego. Andanças e andanças. Perde o sossego. Currículo espalhado sem "esperança", mas sabe onde a encontrar . . . Indenizado, volta à casa lotérica. Como esperado, a "esperança" se encontra ainda lá. Após cumprimentá-la desculpa-se de a ter abandonado . . . Rediviva, reanimada, a "esperança" reinicia o seu falar: "Compre uma cartela, ou um bilhete da fortuna, só pra tentar ´a sorte´, e conte comigo, não se importe!" - E, só dessa vez, ela completa: "Se você não ganhar, não me culpe. A culpa é da sorte!". Fernando A Freire
Enviado por Fernando A Freire em 05/09/2019
Alterado em 13/09/2019 |