DINOSSAUROS CACAREJEIROS
Henrique e seu primo Luiz vão à livraria. Mãos nas mãos das mamães irmãs. Curiosos, lá se deparam com a seção de literatura infantil, onde se entretêm . Ali, sob promessa de ficarem bem comportados, começam a folhear alguns livros interessantes. As mamães, confiantes, se afastam por um momento, enquanto escolhem algum livro noutras seções do mesmo piso. - "Adulto só sabe conversar com adulto!" - Caçoam as duas crianças que - nem se dão conta - preferem conversar só com crianças. Luiz, com quase sete anos, vai lendo para Henrique (dois anos mais novo) tudo que se refere aos dinossauros – a paixão infantil do momento. Influencia e convence o primo a, com ele, manusear um livro que ali encontrara, contendo textos e bastante ilustrações acerca desses répteis pré-históricos. É quando descobrem que existiram vários tipos de dinossauro. Dentre muitos, lhes chamou a atenção o Tyrannosaurus Rex - carnívoro dos mais agressivos. - "Caramba!... Ele comia diversos animais, até mesmo os dinossauros herbívoros, quando mortos!" - conta Luiz, admirado. - "Poxa!... Costumava, também, roubar os ovos de outros dinossauros, com o intuito de maturá-los e se alimentar dos filhotes!" - continuava, contemplativo, a ofegante ou mais que deliciosa leitura. - "E o que é maturá-los?" - pergunta Henrique. - "Sei não. Vou perguntar a minha mãe. Ela sabe de tudo!" - responde Luiz, orgulhoso. - "Pode deixar. Eu mesmo pergunto à minha. Ela também sabe de tudo!" – impede-o Henrique, igualmente presunçoso. Aquela informação deixa Henrique um tanto angustiado. Ele se queixa da pouca inteligência da mãe dinossauro(a), que deveria enterrar os seus ovos a fim de protegê-los dos predadores. Quando estavam mais empolgados com a leitura, as mamães vêm buscá-los. Despedem-se, com promessa de, mais tarde, novamente juntos, comemorarem o aniversário de Luiz. Ainda na livraria, já na ausência de Luiz, Henrique leva a mãe de volta à sessão de infantis e lhe aponta o livro de que mais o primo se interessara e que, por certo, gostará de recebê-lo de presente. Raïssa atendeu à sugestão do filho e comprou logo dois exemplares: o primeiro para Luiz e o segundo para o seu pequeno leitor, cuja espontaneidade de escolha a surpreendeu. Henrique, de volta a casa, estava deveras contente com o seu inesperado presente, igualzinho ao do primo aniversariante. Mais tarde foi à festa de aniversário. Luiz fica surpreso e maravilhado com o livro que ele realmente desejava possuir – o presente recebido de Henrique. Compromete-se a ligar todos os dias para trocarem conhecimentos sobre os afamados dinossauros. Em casa - porque Henrique ainda está aprendendo a juntar sílabas, portanto desconhece o sentido de muitas palavras do seu novo livro -, Raïssa lê alguma história e lhe dá as explicações do que esteja ao seu alcance. Aí (porque a mãe sabe de tudo), Henrique corre ao telefone e vai testar os conhecimentos de Luiz. Mas não deixa de perguntar sempre a mesma coisa: - “Por que as fêmeas dos dinossauros não enterravam os seus ovos?...”. E cada vez fica mais intrigado com a evasiva das respostas. Sempre à noite, antes de dormir, a mãe lê para Henrique, ou repete, em tom suave, mais algum trecho pertinente aos dinossauros. Ele ouve, adormece e, às vezes, sonha. Passam-se alguns dias. Seu aniversário está próximo. A mãe começa a pensar no tema. Aí: - pede-lhe uma sugestão - e ele emudece (ela percebe que algo de estranho acontece); - tenta contar-lhe uma história - e ele se recusa a ouvi-la; - fala dos preparativos para o aniversário - ele nada diz e vai dormir ... Motivo de inquietação... Outra preocupação – até maior - para Raïssa: - todos os ovos que comprara, no dia anterior, desapareceram da geladeira, sem explicação. Pede à cozinheira para comprar nova bandeja de ovos. Coloca-os na geladeira e fica atenta. Mora num condomínio de campo em que tudo no entorno é visível. Quem teria adentrado em sua casa, às escondidas, nesses dias? O jardineiro? A faxineira? A passadeira?. . . Todos, serviçais de sua inteira confiança. Não se sentirá bem interrogando qualquer um deles. Pouco lhe interessa encontrar o culpado, mas o mistério. E o problema se repete. A cozinheira comprou novos ovos, lavou-os e colocou-os na geladeira. No dia seguinte, mais uma vez, todos desapareceram sem qualquer explicação. Seis dúzias de ovos perdidas. E agora? Fazer o quê? Não havia rastros estranhos em torno da casa... A vizinhança já começa a espalhar que algum animal misterioso, alado, ronda o condomínio, surrupiando ovos de galinha das geladeiras. À boca pequena, todos os condôminos vão ficando em polvorosa. Num belo dia, o jardineiro confidencia a dona Raïssa que, ao afofar a terra, em algumas partes do jardim, tem encontrado ovos enterrados. – “Será catimbó, madame?!...” – desconfia. Raïssa responde que não. Agradece a informação e diz que está tudo sob controle. Pede, apenas, que ele fique quieto e marque os lugares onde os ovos estão aparecendo. Sai, em seguida, para buscar o filho no colégio. Henrique continua cabisbaixo. Alguma coisa o perturba. Ao chegar a casa, a mãe, percebendo que não cessa o mau humor do seu filhote, abraça-o e o põe no colo. Pede que ele desabafe, diga-lhe o que tanto o preocupa... Ele responde que teve um sonho, mas nada pode dizer. Somente Luiz sabe do ocorrido, mas também nada pode contar, senão estará tudo perdido. Raïssa insiste, dizendo que “todo sonho que os filhos contam às mães se realiza”. E ela, se escutar esse seu sonho, promete segredo absoluto. Henrique, enfim, depois de oito longos dias, abriu um sorriso. Acreditando na promessa da mãe de tudo segredar, encosta os lábios em seu ouvido e sussurra os detalhes de um belo sonho: - “Eu estava conversando com os dinossauros nas montanhas. Aí, pedi à mãe dinossauro(a) para que ela enterrasse os seus ovos... Uma maneira de salvar os pobres filhotes das garras dos predadores. Ela me respondeu que, assim, eles morreriam sufocados, mas topava fazer uma experiência em nosso jardim. Eu e Luiz plantaríamos os ovos de galinha e ela, todas as noites, viria maturá-los. Lembra quando lhe perguntei o significado de "maturá-los?" Então, pelo que a mãe dinossauro(a) disse, logo, logo, ao invés de pintinhos, nasceriam dinossauros pequeninos. Pediu segredo. Se eu ou Luiz falássemos dessa experiência para qualquer outra pessoa, todos os ovos iam gorar e se perderia a incubação"... Raïssa pensa: - "se as crianças não sonhassem bobagens, o mundo seria cinzento!" - e o reanima: “Pois, filho, acredite no seu sonho!”. Enfim, encontra o tema de aniversário que estava procurando. Empolgada, raspa o tacho de suas economias e... Secretamente, encomenda três dúzias de dinossauros infláveis (metade da quantidade dos ovos plantados no seu jardim), todos com quase um metro de comprimento. Combinou com profissionais de recreação para colocá-los nos pontos indicados pelo jardineiro, que escavará o chão, enterrará os dinossauros, recheados de balas e chocolates, e recobrirá tudo com grama sintética. Isto há de ser feito na manhã do aniversário do filho. Também combinou com a irmã, Ana Emília, mãe de Luiz, para levar Henrique na véspera do aniversário e somente trazê-lo no exato momento da festa. A essa altura, o jardineiro e os dois profissionais de recreação são os únicos cientes do que vai acontecer. A surpresa será para o aniversariante e os convidados. E assim se fez. Chegou o dia do aniversário. Todo o terraço da casa está enfeitado. Figuras de dinossauros distribuídas pelas paredes. Uma grande mesa comportando o bolo, com formato de dinossauro, e tigelas com guloseimas. O casal de profissionais da recreação, fantasiado de palhaço, entretém os convidados que vão chegando e se achegando. A festa começa. O jardim da casa é extenso. Lá no portão aparece Luiz. Em seguida, Henrique de mãos dadas com a sua tia Ana Emília. Os amigos correm para recebê-los em algazarra. O aniversariante não teve nenhuma chance de perceber qualquer reboliço no leiaute do jardim. Avança, sob festejos, e entra na brincadeira. Cantam, dançam, pulam, correm, medem força, fazem teatrinho, fazem mágica, sorteio... Excelente recreio. Aí, é chegada a hora de cantar “parabéns”, apagar a vela e partir o bolo. Vai tudo correndo bem nesta mesma ordem. No instante em que o aniversariante dá o primeiro corte no bolo, o jardineiro, avisado, e os dois palhaços gritam bem forte, através de alto-falantes: “Estão nascendo dinossauros!”... “Corram, estão nascendo muitos dinossauros!”... - E começam a remover as placas de grama sintética, atirando-as para bem distante. Os garotos convidados, correm para o local e, comandados pelos dois palhaços, cada um pega o seu dinossauro inflado e com o corpo recheado de balas e chocolates... E se questionam: “Como pode ter acontecido isto? Passamos aqui há pouco tempo, pisamos na grama e não vimos nenhum buraco na terra! De repente, tudo escavado... Como pode? Henrique fica parado, diante do seu bolo, atônito, isolado e sem acreditar no que estava vendo. Mais ou menos a mesma quantidade de ovos de galinha que ele plantou estava ali, agora, transformada em dinossauros. Cessada a barulheira, vendo cada um dos seus convidados com um dinossauro relativamente grande debaixo do braço, resolve contar o seu sonho. Não encontra jeito nem forças para falar. Raïssa, então, toma a palavra e esclarece: “Acreditando num sonho, Henrique plantou ovos de galinha para nascerem dinossauros. Pronto! Aí está, nos braços de cada um de vocês, a realização de um sonho. Acreditem nos seus sonhos!”. Aplausos e muitos abraços no garoto que sabe guardar segredo, mesmo que se refira a um sonho impossível. Sobrou um dinossauro, graças!... Raïssa dependurou-o na parede do quarto do filho. Diz achar que eram exatamente assim os dinossauros recém-nascidos. Quando o filho sente que o objeto do seu sonho está murchando, perdendo forças, a mãe o enche com o seu próprio oxigênio. Essa pobre mãe só se desespera quando não encontra jeito de responder a mais alguma pergunta do filho, tal como: - “Mamãe, você está lembrada se, há sessenta e cinco milhões de anos, já existia material plástico? (fernandoafreire) _________________________________________________________ Obs: uma história real que aconteceu no ano 2010. Fernando A Freire
Enviado por Fernando A Freire em 10/10/2020
Alterado em 14/12/2020 |