SANTO DE CASA NÃO FAZ MÁGICA
Trasanteontem (26/07) foi o Dia dos Avós. Homenageado pelos meus cinco netos - Sarah, Luiz, Henrique, Maria Júlia e Ibrahim -, forcei um pouco a memória para relembrar alguns dos momentos passados em que brincávamos juntos, no mesmo apartamento de hoje: "o que é, o que é", "futebol de sala" (quando quebrava um jarro da vovó, a gente mudava a brincadeira para "pique-esconde"), "lá vem o trem" (três netos arrastados numa rede, da cozinha até a sala; as poltronas do único vagão eram travesseiros trazidos dos quartos de dormir)... Embora leigo no assunto, mas com o intento de variar a diversão, adquiri alguns acessórios para aprendizado e prática de "mágica de perto". Quase deu certo!... Meus primeiros passes de mágica até que surpreenderam aquela ingênua plateia miúda. Miúda e mais ou menos atenta: à época, constituída de apenas quatro netos (dois casais), de quatro a sete anos de idade, todos alegremente imprensados num mesmo sofá da sala. Ufa! Com o tempo, cobravam-me repetidas exibições, sinal de que lhes estava agradando. Temendo perder o prestígio logo na primeira escorregada, caprichei o quanto pude no manuseio dos instrumentos indispensáveis (e intocáveis) do meu novo trabalho. Um erro, por menor que fosse, me levaria à fila de mágicos desempregados. "Ai, Deus, quantos estão assim no meu país!"... Só comecei a sentir que progredia quando, no retorno às aulas, a professora de Henrique pediu que ele, de pé, informasse aos seus coleguinhas alguma coisa boa que mais marcou suas férias. A resposta foi simples e imediata: "Gostei muito das mágicas do meu avô". Claro que me envaideci. De repente, virei um vovô fantástico, por que não?!... Se os coleguinhas de Henrique me pediam para fazer "desaparecer" alguma coisa, claro que eu driblava: "Não, eu sou um mágico moderno: só trabalho em casa e faço aparecer o inesperado". "Mas vovô, você é mágico mesmo ou faz milagres?" - Ouvi, certa vez, de uma vovó, que depois me confessou que também praticava mágicas. Até me ensinou como fazer desaparecer uma esferográfica apenas esfregando-a nas mãos. Depois - muitas exibições depois -, Sarinha veio me perguntar por que eu usava uma esferográfica presa com elástico na parte interna do blusão (?). Mas, vamos à principal mágica aprendida. Inventei de transformar um diminuto lenço verde numa cédula de dois reais. Cabia num dedal da cor da pele. O lenço ficara escondido dentro do dedal, de onde a cédula fora sutilmente retirada. Haja cédulas, entrando a cada espetáculo no bolso de cada um dos netos. Até aí, minha moral de mágico alcançava crescente alta. Aplausos!... Todos me perguntavam como isso aconteceu (?)... Pediam bis, certamente visando a circulação de mais moedas na praça. Vale agora lembrar minha última exibição. Perguntaram-me por que só saíam cédula de dois reais (?). Expliquei que era por causa do tamanho do lenço: "Lenço pequeno, dinheiro pouco; se o lenço fosse maior, então...". - "Grande drible", pensei ! . . . Aí - não contava com essa -, todos quatro netinhos, com certeza combinados, correram até o quarto da vovó e, serelepes, trouxeram o lençol da cama da vovó, pondo-o no encosto da cadeira ao meu lado... Pior: insistiram para que eu o introduzisse no dedal mágico. Queriam um dinheiro maior. Chega de cédulazinhas de dois reais!... - Gritaram. Como se não bastasse minha frustração, Henrique pôs um ponto final na minha carreira: "Você não é mágico, vovô!... Mágico é o que foi ontem em minha escola. Ele balançou o chapéu com dois ovinhos de passarinho. Depois, botou o chapéu na cabeça. Daí a pouco, quando tirou o chapéu, saíram dali, voando, dois bonitos passarinhos. Isso, sim, é que é mágica ! . . . Sem ter muito o que dizer para eles, ou melhor, concordando com eles, encerrei o espetáculo com esta expressão: "Pois é, meus queridos netos, a vida é assim!... Tudo passa, como num PÁSSARO de mágica". Fernando A Freire
Enviado por Fernando A Freire em 29/07/2021
Alterado em 08/08/2021 |