MÃE CORUJA
A coruja tem aversão às águias, não tanto ao fogo. Conta-se que ela pediu à águia para não comer os seus filhotes, se os encontrasse. - "E como são os seus filhotes?" - perguntou a predadora. - "Ah, eles são lindos!... Seus biquinhos parecem diamante e suas penas são verdadeiros brilhantes" - respondeu a mãe coruja. No dia seguinte, ela não encontra seus filhotes no ninho e se queixa de dona águia - a rainha de todas as aves: - "Mas majestade, a senhora me garantiu!...". - "Sim, dona coruja, garanti e juro que não os comi - palavra de rainha! As avezinhas que encontrei nesse ninho, sem bico e ainda sem penas, eram tão feias que davam pena! Falando sério, só sei dizer que estavam muito saborosas!"... Generalizando: também só sei dizer que toda mãe é possessiva. E mais: levando o assunto para o lado gramatical, "mãe possessiva" é um baita pleonasmo. Sua preocupação extrema, seu desnecessário zelo excessivo, seu amor desmedido (...) levam-na a defender as falhas dos filhos, a sofrer com os seus sofrimentos, a defender as suas inverdades, a até matar-se por eles... Muitas vezes, eles não estão nem aí para essa entrega maternal e apaixonada! Mesmo assim, qual criatura mãe, por indigna que seja - no fundo, no fundo - não é uma mãe coruja?!... . . . . . Acompanhei, no último mês de agosto, pelos meios de comunicação disponíveis, todo esforço das equipes de salvação do SOS PANTANAL para resgatar animais selvagens e prestar apoio às comunidades daquela região. Vi que o "chefe" da nação é fogo mesmo - e deve até orgulhar-se de ter feito "corpo mole" e superado seu irmão (o arrevesado Nero) ao apoiar/provocar ali o maior incêndio da história (30% do bioma matogrossense - fauna e flora - acabou tragado pelas chamas). Muitas Romas, juntas, incendiadas. Animais em fuga - e os que ficavam pelo caminho, se impossível socorrê-los, viravam cinza. Um trágico espetáculo de desamor à natureza - ou melhor: de desfazimento das coisas de Deus. Acompanhei essa luta pela TV - e um instantâneo quadro belo-horrível me chamou a atenção. Ainda esperei que algum repórter explorasse esse momento, mas acho que lhes passou despercebido esse átimo da vivência e ponto final de uma pobre mãe. E é um pedacinho dessa vivência que agora eu conto, principalmente porque se trata de uma coruja, i.e., de mais uma sacrificada mãe coruja. Todos os animais, vertebrados e invertebrados, tentavam escapar, por terra ou pelo ar, das velozes labaredas. A corujinha observava o alvoroço dos que queriam sobreviver e o avanço do fogo destruidor em derredor, mas não arredava o pé de um galho da árvore onde, aparentemente, repousava. - "Não, não repousava" - assegurou-me um entendido no assunto - "Ela cuidava dos seus filhotes, cujo ninho preparara no subsolo de um terreno arenoso - uma forma de escondê-los dos predadores". Se a retirassem dali, com certeza ela retornaria na esperança de salvar suas "lindas" crias. Entretanto, pelo que se deduz, ela ali permaneceu, porque, desde o dia em que veio ao mundo, jurou, se imperioso, morrer de amor pelos seus. Assim vivem as mães corujas. Assim amam. Assim fecham os olhos para os mais nefastos perigos... e morrem. Fernando A Freire
Enviado por Fernando A Freire em 12/12/2021
Alterado em 14/12/2021 |